Às vezes acho que a vida se parte em pedaços, alguns guardamos com carinho e outros fazemos de tudo para os esquecer. Todos eles são parte de nós que nunca irão desaparecer, podem até acalmar, mas assim como um trauma físico leva a uma cicatriz, considero que tudo o que vivemos também são cicatrizes, pode já não ser um problema mas a marca ficará sempre lá. Todos os instantes da nossa vida moldam-nos, fazem parte de nós, às vezes estão só soltos sem alguma lógica aparente e que nos levam a uma confusão de pensamentos. Talvez seja isso que estou a tentar fazer aqui : juntar todos os pedaços, um instante de cada vez.
Ontem, por algum motivo, acordei bem. E isso, por si só, já foi estranho. Depois de quatro turnos seguidos, a caminho do quinto, acordei renovada. Não é habitual , com o início da sertralina e também nesta fase complicada de adaptação, ansiedade e tristeza, as minhas manhãs têm sido todas muito iguais: acordar cansada, nauseada, com tonturas, sem apetite , alterações gastrointestinais, sem paciência, acordar já com palpitações sem causa aparente. Ontem acordei leve, bem-disposta, fiz coisas que não costumo fazer, atendi uma chamada de uma amiga logo de manhã, (o que é raro, devido à minha falta de paciência e não gostar de falar por chamadas). Falamos 1 hora e enquanto isso tive energia para tomar o pequeno almoço, arrumar a cozinha e arrumar o quarto. Tomei um banho sem pressa, até dancei e cantei no banho, acreditam? E foi aí que me surgiu o pensamento: “Isto não é normal, estou muito bem disposta, algo vai correr mal!” Como se o simples facto de me sentir bem fosse um aviso de que algo mau fosse acontecer. Respirei fundo e continuei a preparar-me para ir para o trabalho.
Depois, aconteceu algo ainda mais improvável : cheguei ao trabalho e arranjei logo um lugar para estacionar, é raro, e nesse momento recebo uma chamada a dizer que estava uma pessoa a mais e se eu queria ficar em casa. Qual a probabilidade de isto tudo acontecer em um só dia? Entrei no carro e fiquei uns 10 minutos a pensar. Será um sinal? Será que devia simplesmente aceitar que estou a ter um dia bom ou preparar-me já para a queda? Voltei para casa, contente por a folga e ansiosa com o medo do que poderia vir por ai. Nunca conduzi tão cautelosamente.
Mas o dia continuou. Sem nada de mal acontecer. Jantei com o meu marido, sentei-me no escritório, que nunca uso, e decidi começar a estruturar este Blog. Organizei ideias, escrevi sem muita preocupação e de uma forma livre. Comecei algo que, de alguma forma, estava a fazer sentido. No fim do dia, percebi que já não me lembrava da última vez em que tive um dia simplesmente bom, mas será que o aproveitei como deveria ou a ansiedade tentou sempre ocupar um lugar? Talvez seja mesmo por isto que comecei este blog. Para guardar estes instantes e, quem sabe aprender a aceitá-los sem medo e a refletir sobre eles. Se chegaste até aqui obrigada por leres, mas acima de tudo faço isto por mim.

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